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Psicanálise como psicoterapia "escultural"

  • Foto do escritor: Mônica Blattner Camerini
    Mônica Blattner Camerini
  • 15 de nov. de 2017
  • 3 min de leitura

Para começar a desvendar a psicanálise escolhi trazer algo que remonta às suas origens e que se trata de uma diferença fundamental entre a ela e alguns outros tipos de psicoterapias, que influencia no tempo da terapia e em como se processa a relação profissional/paciente.

Existem as terapias que agregam algo externo (tal como dicas, conselhos) através da sugestão ou da persuasão a fim de modificar a personalidade ou de adequá-la a condutas mais moralmente aceitas. Outras não agregam nada, apenas buscam o conhecimento da personalidade mais autêntica criando condições para que o indivíduo, conhecendo seu funcionamento, aprenda com experiências e viva as intempéries com menos sofrimento e sintoma.

Freud usou o modelo de Leonardo Da Vinci para diferenciar as artes plásticas para explicar essa diferença básica e fundamental: métodos que utilizam a sugestão e a persuasão, atuam per via di porre que, assim como a pintura, agrega cores e formas à uma tela em branco para que se modifique a imagem enquanto que a psicanálise funciona per via di levare, como uma escultura, que retira os excessos para que a estátua apareça no mármore, sem acrescentar nada a mais.

Como essa diferença se passou?

Inicialmente o método que o meio médico encontrou para investigar o sintoma psíquico foi a hipnose e seu foco era a simples remoção do sintoma. Ela utilizava a sugestão moral para que o paciente esquecesse seus sintomas ou pensamentos e se encaminhasse para condutas ou comportamentos mais sãos. Vemos aí a influência da moral sobre o corpo, onde a conduta curativa do médico se sobrepõe à do paciente que acata a sugestão em atitude totalmente passiva.

Breuer, um médico vienense do século XIX, fez uma modificação técnica e passou a usar a sugestão hipnótica de outra forma, não para que o paciente esquecesse, mas para que recordasse e expusesse seus pensamentos. A exposição de alguns pensamentos e recordações pareciam um expurgo e vinham associados a descargas emocionais, muitas vezes traumáticas, e os sintomas eram muitas vezes aliviados. Essa é a base do método catártico e esse tipo de terapia foi batizada de “cura pela fala”.

A catarse se fundamenta no conceito de dissociação de consciência, que, de forma bem básica, ocorre quando um determinado acontecimento se dá na vida de uma pessoa e esta, por questões pessoais, não consegue processá-lo bem emocionalmente (como um trauma, por exemplo) e, para preservar a consciência desse fato “insuportável”, ele é afastado, ficando na sombra inconsciente. Usando a hipnose para expandir a consciência, Breuer percebeu que o indivíduo conseguia voltar a esse ponto chave e o acontecimento que fora dissociado poderia então ter a chance de retornar ao processo associativo normal, ser elaborado e se integrar na consciência.

Freud começou a trabalhar com Breuer e a utilizar a terapia pela fala utilizando a sugestão hipnótica para provocar a catarse em seus pacientes. Ele optou por abandonar a hipnose pois não conseguia hipnotizar todo mundo e acabou estabelecendo diálogos com seus pacientes. Por sua necessidade de saber e possível pressa científica, passou da sugestão para a coerção, onde ele estimulava e pressionava (inclusive fisicamente) o paciente a recordar. Criou a coerção associativa.

Essa técnica mostrou a Freud que as coisas eram esquecidas (dissociadas) porque eram dolorosas, feias, contrárias à moral ou à ética e que, por isso havia uma força de resistência que impedia que esses fatos regressassem à consciência. A coerção então, esbarrava nessa resistência, uma vez que, quanto mais se forçava, mais resistência se encontrava.

Freud notou haver um jogo de forças entre o desejo de recordar e livrar-se do sintoma e o desejo de esquecer e achou que seria melhor deixar o paciente falar livremente. Surge então uma regra fundamental da psicanálise: a associação livre. Nessa técnica o médico/terapeuta basicamente se presta a ouvir com atenção a fala livre do paciente e a notar associações que este faz sem que tenha consciência.

A psicanalise surge daí, de um diálogo entre 2 pessoas donas de si. Trata-se de uma mudança de paradigma na relação terapeuta/paciente, onde esse último não é mais passivo, mas participa ativamente de seu tratamento que tem agora como foco a ampliação e integração da consciência, sendo a remoção do sintoma uma consequência.

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